Mas se temos um "pibinho" per capita, temos uma ânsia de ter uma inflação suíça. Nossa meta é 3%! E se saímos dos limites prudenciais, definidos pelo governo de plantão, o BC independente desce o chicote dos juros nas costas da população que não vive de juros.
Onde está o erro? Deve estar nas políticas que fazem o gasto público ser maior que a arrecadação e exigem que o estado aumente sua dívida pública que já consome mais da metade da arrecadação. É frequente ouvir que os direitos criados pela CF-88 não cabem no arcabouço fiscal.
Segurança alimentar, saúde gratuita, educação gratuita, transporte coletivo com algum tipo de política que subsidie o deslocamento dos mais pobres, o crescimento dos pagamentos das aposentadorias pelo valor do salário mínimo que tem sido reajustado acima da inflação (assim como o Bolsa Família, os Benefícios de Prestação Continuada BPC), tudo isso que reduz as diferenças em um país cujo maior problema não é a inflação e sim a desigualdade social, deve ser repensado.
Hoje a distribuição de recursos públicos por meio de manobras escusas dos congressistas, que em grande medida são os responsáveis pela manutenção da atual situação de insolvência pública através das emendas parlamentares e outras manobras que garantem que os grandes detentores do poder continuem se beneficiar da influência que exercem sobre os congressistas.
Senão como explicar a proteção dos super salários, enquanto a resolução acerca dos brasileiros que ganham até cinco mil reais não pagarem IR ainda não ter sido resolvida? Todos sabem que é uma medida correta, mas os decisores não acham correto que o financiamento dessa medida seja pago pelos que tem mais dinheiro. Como explicar a imensa carga de isenções de impostos — o Brasil tem cerca de R$ 540 bilhões de isenções de todo tipo ao ano. Decisões que foram se somando ao longo do tempo para beneficiar na maioria das vezes os que detém o capital.
O simples, a agricultura, cesta básica, agrotóxicos, a zona franca, as igrejas, as instituições filantrópicas. Muitas delas olhadas a distância — sim, parecem que se trata de uma disposição civilizatória. Mas de perto elas todas estão negociando direitos e não se constrói um país civilizado com renúncias fiscais. Mas vamos ver mais questões que podem fazer com que se consiga entender melhor essa complexidade chamada Brasil.
O que se anuncia é que os programas de distribuição de renda, como os já mencionados acima, não tem impacto na população e, na verdade, tem gerado falta de mãos de obra, pois o o a recursos tem gerado acomodação nos alvos dessas politicas deletérias. Os pobres não querem mais trabalhar!
De acordo com dados do IBGE e da última PNADC — Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar Continua (de 5/8), nos últimos três anos a renda domiciliar per capita cresceu 10% e a inflação dos alimentos cresceu 8% (entre os mais pobres a renda cresceu 19%). O Brasil voltou a se afastar do grave problema da insegurança alimentar, que durante a pandemia voltou a crescer e com casos de desnutrição grave que não eram mais vistos desde os anos 2000.
Somente por meio de políticas públicas voltadas para garantir segurança alimentar um país com o nível de desigualdade social do Brasil pode enfrentar a fome. Ter estoques reguladores, ter decisões de aumentar o o dos mais pobres a alimentos distribuídos por decisões do estado faz com que os pobres possam comer três vezes ao dia.
Por estes dias uma importante publicação foi realizada pelo Lancet sobre os sucessos do Bolsa Família — em 20 anos foram evitadas cerca de 740 mil mortes no país! Certamente os que deixaram de morrer eram os mais frágeis — as crianças e os velhos pobres. A doença neste país tem CEP — está nas periferias das grandes cidades e nos guetos deste celeiro do mundo.
Distribuição de parte ínfima da riqueza da sociedade arrecadada por impostos, uma pequena parte deles, mudou o perfil da mortalidade. Da mesma maneira que hoje já é possível ver o resultado das políticas de cotas. Com a consolidação das cotas em 2016, a participação do quinto mais rico caiu pela metade, representando 31,5% das matrículas. Enquanto isso, a presença dos três quintos mais pobres praticamente triplicou. Pretos, pardos e indígenas, que representavam 31,5% dos matriculados em 2001, aram a ser 52,4% em 2021.
Politicas publicas de distribuição de dinheiro, de garantia de um crescimento maior que a inflação para pagamentos de aposentadorias e BPC, da existência de ações deliberadas voltadas para criar segurança alimentar, as políticas de cotas — que conseguiram aumentar a presença de negros, pardos e indígenas nas nossas universidades, tiveram que consequências nestes últimos 20 anos? O país piorou? A expectativa de vida caiu? (sim, durante a pandemia perdemos momentaneamente 2 anos ao deixar que morressem 700 mil brasileiros), a mortalidade infantil regrediu as menores taxas que o país já alcançou.
A violência aumentou? Sim, em particular nos grandes centros, mas existem muitas discussões a serem realizadas para entender essa violência urbana. Mas é inegável que a vida melhorou e poderia melhorar mais se conseguíssemos avançar mais com políticas públicas voltadas para ter um país melhor para todos. Estamos em um momento delicado da vida do Brasil, de seu povo e de sua terra.
Até hoje acreditamos que somente fazendo o bolo aumentar dará para redistribuir a riqueza. Mas a nossa terra não aguenta mais exploração. Todos os recursos naturais estão no seu limite. A única maneira de manter a vida na terra e em nosso Brasil será mediante políticas civilizatórias que busquem reduzir as desigualdades. Com certeza a violência urbana, que não tem sido resolvida com a violência policial e o encarceramento, também depende dessa nova decisão.
E esse problema não é do Brasil, é do mundo. Vamos ter a COP-30. Será um momento de olhar para o futuro e redesenhá-lo. Faremos mais do mesmo ou aproveitaremos as lições que temos construído com as políticas de redistribuição de renda, de redução das desigualdades de raça, dos sucessos do SUS? Será que a solução melhor é a aprovação do PL 2159/21 e aprovar o autolicenciamento ambiental? Deixar ar a boiada e instaurar um modelo de gestão ambiental predatório?
Que futuro estamos buscando, para quem?